terça-feira, 13 de outubro de 2009

Cavalo(s) e Brasil


Uma pausa para um diálogo “que fazia muito sentido pr'a gente”
(...)

A: vc viu dia desses
um cavalo sendo atropelado por um carro na (Av.) Brasil?

I: nem vi

A: quer ver?

I: não sei... depende do grau de impacto da cena


A: 


I: super preferia nao ter visto

A: sorry
there's no free lunch, you know

I: ok

A: bem
eu fiquei muito mal nesse dia
(to falando sobre batalhas maiores, como vc disse agora)
pq
tenta imaginar tudo o que teve de acontecer ao mundo pra que um cavalo fosse atropelado na Brasil
em geral
a gente pode pensar
é uma fatalidade
um evento pontual da história humana
e todo mundo se esquece no dia seguinte
o jornalismo ajuda nesse esquecimento crônico
te mostrando outras coisas que são tb cavalos sendo atropelados na Brasil
MAS
PORÉM
CONTUDO
ENTRETANTO
não
não é apenas um evento pontual
é o resultado de uma longa cadeia de acontecimentos
um amostra grátis (e viva o YouTube)
de como falimos todos
como o mundo está falido
como a batalha maior está prestes a ser perdida
veja
o cavalo
foda-se o cavalo
pastava no canteiro central pq não estava amarrado
e pq quem quer que seja o dono
não dá comida apropriada a ele
aliás
o dono
é um pobre morador de uma favela às margens dessa avenida
o dono é um pobre diabo que não tem direito o que comer na mesa, que dirá o que comer no pasto
e o cavalo que se foda
afinal
ele, o dono, tb se fode
ele mora numa favela nas margens da Brasil, lá na merda de Bangu
pq a ideia de ir aglomerar as cidades é crônica e cada vez maior
os prognósticos de urbanistas é que, num futuro próximo, as cidades virem grandes favelas
o Rio
vc sabe
já vive muito disso
com suas favelas que perdem limites e viram complexos
nem os muros
os muros do Cabral
vão solucionar isso,
e o cara que atropelou o cavalo
voltava de uma festa em Campo Grande
estava
claramente
embriagado
não teve nenhuma reação de frenagem ao ver que havia cavalos na pista
nem viu mesmo o guarda que fazia sinal no meio da pista
e era um cavalo
foda-se o cavalo
podia ser uma pessoa
um outro carro
sei lá
o cara bêbado tava dormindo
e lá na festa que ele foi
todos beberam
e vc sabe
a galera bebe mesmo pra esquecer
álcool, de uma forma geral, é uma muleta como todas as outras
vc trabalha a semana inteira
esse cara tb
pra conseguir ir beber no fim de semana
na verdade
vc bebe todo dia se deixar
é assim
se fode
daí bebe pra esquecer que se fode
e se fode de novo
e bebe de novo
e por aí vai a vida inteira
tudo é acessório
tem essa coisa de viver
formar uma família
"ser feliz"
mas na verdade
todo mundo tá só sobrevivendo
tentando atravessar a avenida Brasil esperando não encontrar um cavalo no meio da pista
mas o cavalo
o filho da puta do cavalo
aparece
e aí dá merda
e tudo isso
o cara bêbado, a bebida, a avenida Brasil caótica, a cidade caótica, a favela, o favelado, o jornalista filmando, e policial sinalizando, o pasto, ou a falta do pasto, a comida e a falta da comida, tudo isso são apenas circunstancias dessa grande batalha...
a batalha que todos estão perdendo

I: (ou está todo mundo pastando na Av. Brasil.... e aparece um carro ..
e pronto)

A: todos estão apenas sobrevivendo a tudo
e um cavalo, o filho da puta, o pobre cavalo, morre no lugar de todo mundo.
é um evento pontual
mas é a história recente da humanidade,
sintetizada em 20 segundos
numa imagem plano sequência de 20 fucking seconds
e isso é o que eu chamo de dor do mundo
nesse dia
eu chorei feito uma criança
quando percebe que não ganhou presente de natal
simplesmente pq não é mais criança

I: há quem chame isso de 'associações extremas'

A: é grave?

I: é mais 'triste' do que 'grave'

A: tem cura?

I: só se um carro te atropelar na Brasil, eu diria...

A: o cavalo
sem dúvida
é o que menos sofreu nessa história toda

(...)

10 comentários:

Bruna Gala disse...

Adorei esse post. Realmente, o atropelamento do cavalo é só um sinal extremo de que nada anda bem. Aliás, anda mal há muito tempo... No dia seguinte, deve ter saído uma notícia no Dia e no Extra do gênero. "Homem atropela cavalo na Avenida Brasil". Ninguém se pergunta de onde vem esse cavalo? O que ele faz no meio da avenida? E esse homem?

Realmente, hoje, no Rio, a bebida é realmente uma muleta. Beber para esquecer essa merda toda parece ser a solução mais óbvia.

Sabe, eu morava na Ilha.. E lá havia uns porcos na rua. Com o tempo, foi divulgado que aqueles porcos que estavam andando pelas ruas eram dos traficantes, e que as pessoas eram esquartejadas para depois servir de alimento para os bichinhos. Os porcos já eram detestáveis, tornaram-se horrendos. Nunca soube se isso era verdade. Mas não duvido. Não mesmo...

ste disse...

adorei e acumulei mais uma neurose!

(gente to impressionada como os traficantes cuidam dos porcos, esse papo tbm rola aqui na minha rua...
trafico e suino cultura?! viva o espirito empreendedor!)

carlos disse...

Bem em primeiro lugar tenho que dizer, aqui, que já enviei este comentário mas que ele não foi aceite. Das duas, uma: ou os computadores também se enganam ou então a Maitê tem razão e os tugas não percebem nada disto... Estou a brincar, malta, são mesmo os computadores os culpados ahahahaha Quanto ao teu post, Isabela, achei espetacular a forma como perdeste tanto tempo a pensar numa coisa que não tem interesse nenhum. Não tem interesse dentro dos padrões a que por norma chamamos de "normais", mas que faz todo o sentido para perceber o nosso "Paranormal". Em Portugal ha um pseudo-ditado que diz: "Quando a onde bate na rocha quem se Fode é o mexilhão!" Neste caso o mexilhão foi o cavalo, mas realmente aquele Homem que até podia ir com uns copitos a mais também já há de ter sido mexilhão em alguma altura da sua vida. Aliás se se vier a confirmar que estava bebedo, talvez a bebida seja, como disseste, uma forma de fugir a esse "embate que a onda provoca" (se pensarmos no ditado, para não sentir que a vida o está a foder). Ao início também achei que o cavalo teria sido o que menos sofreu, mas pensando bem, há sofrimento maior do que a impossibilidade de não poder sentir a onda a bater?! Acho que não podemos dizer que quem deixa de sentir, quem deixa de estar vivo, sofre menos. Temos de pensar é que quem passa a um estado "não-vivo" já não aproveita nada daquilo que a existência pode trazer. A existência como um estado inocência e espontaneidade.

Bjos

Carlos disse...

Correcção

do que a impossibilidade de poder sentir a onda a bater?!

:P

SuperGuia - Pousadas disse...

Olá pessoal, gostaria de compartilhar com vocês o SuperGuia – Pousadas (www.pousadas-superguia.com.br). Trata-se de um site bem objetivo e prático com as melhores opções de pousadas no Brasil.
Vale a pena conferir!
Abraços a todos.

Bruna Gala disse...

SuperGuia Pousadas.... O que isto tem a ver com o post? Hahaha! Quanto a este lance dos porcos, eu acho que é mesmo verdade, infelizmente... Não tem cara de lenda urbana não.

Unknown disse...

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zabela disse...

?

Pedro Simão disse...

Coitado do cavalo!

Anónimo disse...

MUITO LEGAL...